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“ADOTE UMA ÁRVORE”

Projeto busca preservação florestal na Amazônia

INICIATIVA - Com R$ 60 ao ano, qualquer pessoa ou empresa poderá “adotar” um vegetal, garantindo sua proteção e beneficiando comunidades locais

Ádria Azevedo | Especial para O Liberal

25/01/2025

Muito se fala sobre a importância da preservação da floresta amazônica para conservar a biodiversidade, conter o aquecimento global e por todos os serviços ecossistêmicos que ela fornece, como melhorias na qualidade da água, do ar, do solo e da polinização, entre tantos outros. Mas para quem mora na cidade pode ser difícil encontrar uma maneira de contribuir, de forma direta, para manter a floresta em pé. Um projeto criado em Belém promete unir quem quer ajudar a quem atua na preservação.


A iniciativa “Adote uma Árvore”, desenvolvida pelo Instituto Terra Verde Brasil em parceria com a Associação da Cadeia Produtiva Florestal (Unifloresta), busca garantir a preservação de cerca de 13 mil árvores no oeste do Pará a partir da contribuição financeira de doadores de R$ 60 ao ano por árvore. Com esse recurso, o espécime é monitorado e protegido. 


A área, uma extensa floresta com rica biodiversidade, fica na comunidade Faveira, no município de Mojuí dos Campos, a aproximadamente 130 quilômetros de Santarém. O monitoramento, que vai garantir a preservação, será realizado via satélite e por drones, e também pelos moradores, que serão recompensados financeiramente pela manutenção da floresta.

 

RENDA

 

Fernando Albuquerque, assessor jurídico do Instituto Terra Verde Brasil, conta que o projeto surgiu quando uma equipe da instituição atuava na regularização de assentamentos rurais em Mojuí dos Campos. “Ali se identificou a necessidade de se compensar aquela comunidade pelos serviços que a floresta em pé representa, mesmo que de uma forma consorciada com outras culturas”, lembra.


Albuquerque enfatiza que a sustentabilidade precisa estar baseada não apenas na preservação ambiental, mas igualmente no crescimento econômico e no desenvolvimento social. “Precisamos, sim, lutar para manter os serviços ecossistêmicos realizados pela floresta, que têm sua finalidade naquele ambiente. Mas é preciso que os benefícios atinjam também, de forma ampla, o ser humano. Essa é a nossa grande questão”, afirma. 


“Vimos que a necessidade daquela população acabava provocando o desmatamento ilegal, porque ela queria ter um recurso rápido. Mas quando essa população compreende que é possível mudar a matriz econômica, que é possível ter geração de renda aliada a conhecimentos e integração da floresta com outras culturas, ela entende que aquela árvore em pé vai gerar benefícios para a comunidade”, explica o advogado.

 

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“Precisamos, sim, lutar para manter os serviços ecossistêmicos realizados pela floresta, que têm sua finalidade naquele ambiente. Mas é preciso que os benefícios atinjam também, de forma ampla, o ser humano. Essa é a nossa grande questão”, afirma Fernando Albuquerque (Foto: Igor Mota/O Liberal)

Famílias serão recompensadas

 

A previsão é que cerca de 30 famílias ligadas à Associação Comunitária de Agricultores e Produtores Rurais da Comunidade Faveira sejam beneficiadas pelo projeto, nos 15 lotes dos assentamentos Moju I e II, em Mojuí dos Campos. Elas serão recompensadas financeiramente pela manutenção e pelo monitoramento das árvores adotadas, mas o recurso arrecadado junto a doadores irá além: também servirá para levar conhecimentos à população local.


“Daremos assistência técnica, levando cursos, workshops, para que a gente possa identificar a necessidade daquela comunidade e auxiliar na mudança de sua geração de renda. Ou seja, aqueles R$ 60 serão usados para a manutenção da árvore, mas também para orientar no extrativismo ou propor novos tipos de cultura consorciadas, com árvores frutíferas, ou mesmo com outros plantios dentro de áreas em que isso é possível”, detalha o advogado Fernando Albuquerque.

 

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Equipe do Projeto Adote uma Árvore com famílias ligadas à Associação Comunitária de Agricultores e Produtores Rurais da Comunidade Faveira (Foto: Divulgação)

Inventário florestal e certificado de adoção

 

Para oferecer as árvores à adoção, o primeiro passo do projeto foi elaborar um inventário florestal, para identificar todos os vegetais existentes na área. “Com isso, uma determinada árvore vai ter um ponto dentro do loteamento rural, e uma coordenada geográfica específica. Isso permite que a gente gere um certificado em nome da pessoa que for adotar, de que sua doação se refere àquela árvore escolhida, dando transparência para o adotante”, explica Albuquerque.


No ato de adoção, que pode ser realizado pelo site www.adoteumaarvore.org ou pelas redes sociais do projeto no Instagram ou Facebook, o interessado poderá escolher a árvore por espécie. Será possível adotar, por exemplo, especificamente uma castanheira. O projeto pretende registrar em vídeos o monitoramento das árvores, possibilitando que o adotante acompanhe seu crescimento e manutenção. Mas, de início, o trabalho será realizado por meio de visitas dos produtores rurais dos assentamentos envolvidos, que farão acompanhamentos periódicos até os locais das árvores. “Com isso, também haverá a conscientização do próprio produtor local, que acabará igualmente adotando aquela árvore como sua”, diz o assessor jurídico.


A agricultora Francisca Silva, da comunidade Faveira, aguarda com expectativa o desenvolvimento do projeto. “Aqui, o pessoal pensa muito em derrubar as árvores. Nós precisamos colocar para as pessoas que elas precisam ganhar dinheiro sem desmatar, que é preciso mudar a economia sem fazer o desmatamento. Mas, para isso, precisamos de apoio. Então, esse recurso do projeto será muito bem-vindo para a comunidade, para transformar nossa situação atual e para que as pessoas consigam ganhar dinheiro com as árvores em pé. Espero que a concretização desse projeto não demore a chegar”, anseia.

Próximo destino: Prainha

 

Além do projeto em Mojuí dos Campos, o “Adote uma árvore” visa uma nova frente de atuação. Ao invés da preservação de floresta nativa, evitando sua derrubada, a ideia é fazer o reflorestamento de uma área já degradada.


O local escolhido para isso foi uma propriedade rural particular no município de Prainha, também no oeste do Pará, onde foi constatado pelo projeto que há déficit de cobertura vegetal. “Entramos nessa nova fase, em busca de imóveis que sofreram desmatamento ilegal e que hoje podem ser reflorestados, gerando captação de carbono da atmosfera ao mesmo tempo em que se gera renda, regularização e conscientização”, esclarece Fernando Albuquerque.


Na fazenda selecionada, o projeto atualmente faz o inventário florestal, para depois, junto com o proprietário, dar início ao plantio de novas árvores. Contudo, assim como na comunidade Faveira, o objetivo é também beneficiar a comunidade do entorno do imóvel. 


“Em contato com as associações rurais locais, já identificamos cerca de 20 famílias que moram ao redor da fazenda, para as quais vamos levar cursos e formações. Naquela região há um impacto muito forte pela questão do desmatamento. Então, vamos levar a conscientização para que as comunidades também adotem as árvores, que não é preciso derrubá-las e fazer uma venda ilegal, porque será possível mantê-las em pé gerando renda”, destaca.

 

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Primeira árvore adotada, por Leonardo Carvalho, idealizador do projeto (Foto: Divulgação)

FINANCIAMENTO

 

Atualmente, o projeto busca financiadores para adotar as árvores. “O momento que nós vivenciamos, principalmente quando os olhos estão voltados para a Amazônia e para a realização da COP 30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025), é de possibilidade exponencial de mudar essa mentalidade. Então, hoje, o projeto precisa de mais apoio, de mais visibilidade. Pretendemos mostrar sua viabilidade e estimular empresas e o próprio governo a contribuir, para que as comunidades tenham esses incentivos para a mudança de matriz econômica”, avalia Albuquerque.


O especialista sugere acesso a fundos ambientais, como o Fundo Amazônia e o Fundo Amazônia Oriental, para fomentar o projeto. Ao mesmo tempo, busca também formas de beneficiar os adotantes. “Queremos que a pessoa que vai contribuir tenha incentivos fiscais, uma dedução no imposto de renda. Estamos em fase de análise jurídica dessa questão”, adianta.

Foco na responsabilidade socioambiental

 

De acordo com Fernando Albuquerque, o projeto pretende atingir empresas interessadas em ações de responsabilidade socioambiental. “Queremos demonstrar que as empresas podem acessar o projeto e trabalhar esse marketing verde de uma forma positiva, mostrando que é possível equilibrar sua emissão de gases do efeito estufa”, observa.


Para a cientista ambiental e professora do Instituto Federal do Pará Glorgia Farias, as empresas precisam ser cobradas e estimuladas a desenvolver esse tipo de ação. 

 

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Para a cientista ambiental Glorgia Farias, as empresas precisam ser cobradas e estimuladas a desenvolver ações de responsabilidade socioambiental (Foto: Arquivo pessoal)

 

“Iniciativas voltadas para a preservação ambiental e para a recuperação de áreas degradadas são ações fundamentais diante da crise climática que estamos vivendo. Diversas pesquisas mostram que é necessário atuar no nível local para se alcançar a qualidade ambiental e a sustentabilidade almejada. Promover atividades de monitoramento e recuperação e recompensar financeiramente os moradores locais possibilita um maior comprometimento, engajamento e a (re)aproximação da comunidade local do meio natural. Recuperar áreas degradadas e manter a floresta em pé precisa ser entendido como fundamental para promover o desenvolvimento e geração de renda, mas acima de tudo para a manutenção da vida”, afirma a pesquisadora.
 

 


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