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ALTERNATIVAS

Pós-mineração na trilha do turismo

Cavernas, cachoeiras e águas termais são alguns dos atrativos de Parauapebas, município paraense que nasceu e cresceu focado na exploração mineral, mas já mira turismo como matriz alternativa para o pós-mineração. Propostas incluem investimentos em três complexos turísticos

Alice Martins

14/10/2022

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Alexandre Valadares, diretor do IBRAM- Foto: Glenio Campregher

Localizado no sudeste do estado do Pará, Parauapebas é um município que nasceu e cresceu baseado na atividade mineradora. É lá que está localizada a Serra Norte dos Carajás, a maior província mineralógica do mundo. Porém, diante da estimativa de que os recursos minerais se esgotem em aproximadamente 16 anos, o município tem buscado desenvolver uma matriz econômica alternativa, focando no setor turístico, como forma de continuar se desenvolvendo e criando alternativas de emprego e renda para a população. A ideia é investir em rotas de turismo ecológico, com a implantação de espaços que consigam atrair visitantes interessados tanto em conhecer as belezas naturais, quanto em turismo de aventura.

De acordo com Alexandre Valadares Mello, diretor de Relações com Associados e Municípios do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), que reúne as empresas responsáveis por 85% da produção mineral do Brasil, o recomendado é que o planejamento dos municípios para o pós-mineração se inicie mesmo o quanto antes e considere todas as oportunidades do local, pensando no desenvolvimento do município, do estado e da região. “Cada região tem uma característica específica e é preciso fazer um diagnóstico participativo e que se inicie esse projeto durante a vida útil da lavra, quando vamos ter subsídios e recursos para traçar o futuro”, explica.

Segundo Mello, grande parte desse subsídio financeiro vem da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), que é um valor previsto por lei destinado à contraprestação pela utilização econômica dos recursos minerais em seus respectivos territórios. A CFEM deve ser distribuída para diversos fins, sendo 60% destinados para o Distrito Federal e os Municípios onde ocorrer a produção. Parauapebas é, atualmente, o município brasileiro que mais arrecada recursos provenientes da CFEM. Apenas no primeiro semestre deste ano, Parauapebas recebeu R$ 545 milhões da compensação, segundo o Sindicato das Indústrias Minerais do Pará (Simineral).

Segundo o Simineral, esse recurso deve ser utilizado em projetos que, direta ou indiretamente, revertam-se em prol da comunidade local, na forma de melhoria da infraestrutura, da qualidade ambiental, da saúde e da educação. A gestão e fiscalização da CFEM é realizada pela Agência Nacional de Mineração (ANM), autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia.

“A nossa orientação, aqui no IBRAM, é de que as empresas tenham um diálogo permanente com o poder público e a comunidade para planejar como aproveitar esses recursos em prol do território”, ressalta Mello. Para o diretor, é fundamental pensar em uma diversificação econômica. “Por exemplo, em Parauapebas, o turismo pode ser, sim, um dos braços, mas precisamos ir além, trazendo indústrias relacionadas ou não à mineração para a cidade”, sugere.

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Obras do primeiro complexo turístico já começaram e devem ser concluídas até maio de 2023 - Foto: Marcio Nagano

Planejamento prevê construção de complexos turísticos

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Darci Lermen, prefeito de Parauapebas - Foto: Marcio Nagano

A Vale é a empresa que atua na exploração mineral em Parauapebas e, segundo a avaliação da empresa, a atividade mineradora no município está garantida até 2038, podendo esse prazo ser alterado diante de novos estudos. Nesse cenário, o município já iniciou o investimento no primeiro de três complexos turísticos, cujas obras devem ser finalizadas até maio de 2023.

O projeto inclui um parque para a população fazer atividade física e tem como principal atrativo a construção de um lago artificial, que será o cenário das chamadas “águas dançantes”, um conjunto de chafarizes inspirado nas atrações existentes em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, e em Las Vegas, nos Estados Unidos. “Dentro desse parque também teremos uma área gourmet, destacando a gastronomia local. Além disso, será construído um bonde teleférico como mais um atrativo turístico nesse complexo”, afirma o prefeito de Parauapebas, Darci Lermen.

O segundo complexo planejado é o chamado Parque Ecoturismo, um eco resort no estilo “acampamento com glamour” (ou “glamping”), ou seja, uma experiência para desfrutar da imersão na floresta com conforto e sofisticação. A proposta, já tem recurso garantido, mas ainda está em fase de finalização do planejamento técnico. As obras, dos dois complexos, que serão executadas com os recursos do Programa de Saneamento Ambiental, Macrodrenagem e Recuperação de Igarapés e Margens do Rio Parauapebas (Prosap), que somam cerca de  U$ 87,5 milhões de dólares de investimento (cerca de R$ 469 milhões), segundo a Prefeitura, sendo a maior parte do financiamento providenciado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (U$ 70 milhões - quase R$ 375 milhões). O objetivo do Prosap é promover o desenvolvimento sustentável por meio de ações como infraestrutura de saneamento ambiental, mobilidade urbana, qualificação de espaços públicos, reassentamento e remanejamento de pessoas de áreas de risco.

Incentivo ao encontro das culturas paraense e nordestina

Tradição da cidade, a festa junina “Jeca Tatu” é um evento organizado pela Liga das Agremiações Juninas de Parauapebas (Liajup), em parceria com a prefeitura, que reúne milhares de pessoas todos os anos para celebrar o encontro da cultura paraense com a nordestina. Além de comidas e danças típicas, a programação conta com concurso de miss e a “carroçada”, momento que reúne as agremiações juninas com as carroças enfeitadas e brincantes caracterizados percorrendo as ruas da cidade.

Pelo destaque que possui no município, o arraial é a base de inspiração do terceiro complexo turístico planejado para o município, o Parque Cultural Jeca Tatu, cuja entrega está prevista para 2023.Queremos celebrar essa união com muita música, cultura e poesia durante o ano todo, não apenas no mês de junho”, ressalta Darci Lermen.

O parque pretende trazer homenagens a figuras de destaque da música popular brasileira, como Luiz Gonzaga, conhecido como Rei do Baião, e Pinduca, famoso como Rei do Carimbó. “Além de artistas personificando essas figuras, queremos trazer show de hologramas e espaços que representem os biomas Amazônia e Caatinga”, acrescenta o prefeito.

Os recursos para o Parque Cultural Jeca Tatu também virão do Programa de Saneamento Ambiental, Macrodrenagem e Recuperação de Igarapés e Margens do Rio Parauapebas (Prosap).

Cooperativa tenta retomar crescimento após impactos da pandemia

O turismo no município vem se desenvolvendo desde antes desses investimentos. Em 2014, um grupo de condutores de atrativos naturais se organizou e fundou a Cooperativa de Trabalho em Ecoturismo da região de Carajás (Cooperture Carajás), com o intuito de formalizar e ampliar a atividade do turismo, gerar renda e preservar o meio ambiente. Segundo Valdivino Santos, um dos condutores cooperados, hoje cerca de 18 pessoas fazem parte da cooperativa e são responsáveis por viabilizar passeios seguros e bem instruídos aos visitantes.

A cooperativa possui diálogo constante tanto com a prefeitura quanto com a Secretaria de Turismo do Pará e o ICMBio, por meio dos quais vem se estruturando, por meio de cursos como de Língua brasileira de sinais, de atendimento e de inglês. "O turismo hoje é visto como o principal ‘minério’ da região, que ainda não é explorado e que não acaba. É tido como um meio de economia do futuro que vai garantir a sustentabilidade da cidade", acredita o cooperado.

Para o próprio condutor, o turismo tem sido um impulsionador pessoal. Nascido em Teresina, Piauí, e hoje com 51 anos, ele revela que sempre gostou de explorar novos horizontes. Já morou em São Luís (MA), Belém (PA) e se firmou em Parauapebas há 14 anos. Foi vendedor, atuou no setor comercial de redes de televisão e se encantou pelo turismo depois que fez um passeio por uma das rotas da cidade. "Quando vi o que a cidade tinha de potencial turístico, me apaixonei. Eu conhecia algumas pessoas da cooperativa e me informei para ingressar também. Desde então, venho estudando diariamente, buscando aperfeiçoar meu atendimento, conhecer mais da história de cada rota", diz. Segundo Valdivino, a pandemia abalou os planos da cooperativa, mas, neste ano, estão conseguindo levantar novamente as expectativas de crescimento. "Hoje, ainda mantenho empregos paralelos, mas estou na transição para passar a viver só do turismo, me programando financeiramente para poder me dedicar mais à profissão".

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Águas termais - Foto: Marcio Nagano

Do banho gelado, na cachoeira, às águas termais

Como o nome “Parauapebas” já sugere (significa “Rio de Águas Rasas” na língua Tupi-Guarani, as lagoas e os balneários da cidade são uma atração à parte. Na chamada “rota das águas”, o trajeto passa por locais como a estância Águas de Maria e o Recanto Cachoeira do Vale, que proporcionam um banho gelado de cachoeira em meio à mata. Além disso, o visitante conhece o Garimpo das Pedras, onde há a comercialização de gemas minerais, principalmente ametistas e topázios, e visita as águas termais, que proporcionam um mergulho relaxante. Lá, paga-se o valor de entrada de R$ 15 e pode-se desfrutar do banho o quanto quiser. A água tem uma aparência esverdeada e cristalina e permanece quente 24 horas por dia, mesmo durante a noite, com a temperatura entre 35ºC e 40ºC. “Desde 2015, esse espaço entrou para nossa rota de turismo e cada vez mais tem sido frequentado pelos visitantes”, informa o condutor Valdivino Santos.

Arnon Vieira, agente de aeroporto, 32 anos, foi um dos visitantes que passou pelo espaço recentemente. Ele viajou com um grupo de amigos partindo de Marabá e passou boa parte do dia nas águas termais. "O acesso é difícil, mas o lugar é muito bonito. É um passeio diferente do que estamos acostumados e fica muito bacana nas fotos. A gente ficou 'de molho' por um bom tempo, só curtindo a água", conta.

A propriedade privada das águas termais fica na divisa entre Marabá e Parauapebas e o caminho partindo de qualquer uma das cidades é longo (ao menos 1h30) e passa por estradas de piçarra, por isso a opção mais recomendada é visitar com um guia.

Rotas também incentivam turismo de experiência

A cooperativa também mantém no leque de opções a Rota Carajás, com visita à floresta, ao BioParque Vale Amazônia, cavernas, lagoas e cachoeiras, finalizando com a ida à Pedra da Harpia, uma formação rochosa de 600 metros de altitude.

Há ainda a Rota do Búfalo e a Rota do Mel, focadas em atividades no campo com agricultores locais, que apresentam o processo de plantação, apicultura e a degustação da culinária rural. Para quem busca o turismo de experiência, está sendo organizada a Rota Indígena, que, segundo a cooperativa, ainda este ano deve estar em operação e trará atrativos como artesanato, pintura corporal e a pesca nos rios Itacaiúnas e Kateté, utilizando artefatos indígenas.

Hoteis e bares - Segundo Valdivino Santos, da Cooperture, atualmente a maioria dos visitantes que buscam os passeios vêm a Parauapebas por viagem de negócios e o turismo é aproveitado em segundo plano. Mesmo assim, a cidade conta com grandes redes hoteleiras e a taxa de ocupação de hospedagem chega a ultrapassar 90% da capacidade de segunda-feira a sexta-feira, de acordo com Jânio Valadares, presidente do Sindicato das Empresas de Alimentação e Hospitalidade de Parauapebas e Região (Seahpar). “A gente tem evoluído, mas é um processo de médio a longo prazo. Temos trabalhado em conjunto à prefeitura e outros parceiros com capacitações de gastronomia e hotelaria, como atendimento, curso de inglês instrumental, de brigadista de incêndio”, ressalta Valadares.

Hoje, 110 estabelecimentos, entre hotéis, bares e restaurantes, estão associados ou filiados ao sindicato e, de acordo com ele, há uma expectativa de que essa rede continue crescendo à medida que as obras dos complexos turísticos avancem. “Acredito que esse investimento pode não apenas atrair turistas, mas também levar o público interno, os próprios moradores, a circularem mais pelos bares e restaurantes da cidade também”, destaca.

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Cava Arenito II, da Vale, após o reflorestamento - Foto: Marcio Nagano

Parceria da Vale com cooperativa de extrativistas promove recuperação ambiental

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Sérgio Souza Jr., coordenador de Meio Ambiente da mineradora Vale - Foto: Marcio Nagano

Parauapebas é uma cidade cercada por florestas. No território, existem três Unidades de Conservação federais e duas municipais. Desse modo, pensar na preservação do meio ambiente é imprescindível. De acordo com Alexandre Valadares Mello, diretor do IBRAM, todas as empresas mineradoras precisam apresentar um plano de fechamento de mina durante o licenciamento ambiental, antes das operações iniciarem. “As empresas precisam mostrar como planejam fazer a recomposição florestal, ajuste de taludes e o paisagismo do local, dentre outros aspectos”, explica Mello.

Em Parauapebas, a Vale já vem realizando essa recuperação ambiental nas minas cujas atividades findaram. O processo se inicia com o armazenamento de 60 kg a 70 kg de sementes por mês de diversos tipos de árvores nativas, como Jaborandi e Ipê, coletadas pela Cooperativa dos Extrativistas da Flona de Carajás. Após entregues e estocadas cuidadosamente, essas sementes vão para o Viveiro de Mudas, onde passam cerca de um ano por diversas etapas de crescimento.

De acordo com Sérgio Souza Jr., coordenador de meio ambiente da Vale, a ideia é preparar meticulosamente e observar cada muda por cerca de um ano. “O cuidado é contínuo. Nós testamos do início ao fim todas as mudas para garantir maiores chances de sucesso na floresta. As mudas são levadas hoje para 25 áreas no total, na região de Carajás, entre áreas de preservação permanente e áreas mineradas recuperadas”, declara.

Em paralelo ao cultivo das mudas, a equipe de meio ambiente da Vale planeja o destino delas. Para áreas mineradas recuperadas (espaços onde anteriormente se tinha uma mina em funcionamento mas cuja lavra encerrou), o primeiro passo é preparar o terreno para o plantio, desde a recuperação do material orgânico do solo, “tapando o buraco” deixado na cava, até projetar a distribuição onde cada muda vai ficar, considerando o espaço que cada espécie demanda para crescer.

Retorno da fauna - Quando as mudas e o terreno estão prontos, é hora de fazer o plantio. Em algumas áreas como na antiga cava Arenito II, cuja operação finalizou em 2010, hoje a imagem já é inteiramente de floresta. Foram oito hectares de plantio que agora já apresenta muitas árvores crescidas, em pé. “Desde que iniciamos o plantio, temos monitorado a área e já podemos observar até mesmo onças pintadas passando por esse ambiente, o que é um excelente sinal. Quando temos o retorno da fauna, em especial de um animal que está no topo da cadeia alimentar, em uma área recuperada, significa que a floresta está saudável, como desejávamos. Além disso, a fauna presente ajuda a transportar sementes de um canto para o outro, aumentando a biodiversidade de flora”, ressalta Sérgio Souza Jr.

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Parque dos Ipês é uma das atrações turísticas já existentes em Parauapebas - Foto: Marcio Nagano

Parauapebas e seus muitos sotaques

Com uma população atual estimada em 218 mil habitantes (projeções para 2021 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE), a história de Parauapebas se iniciou com a descoberta de grandes jazidas de minério de ferro.

Desde então, o crescimento populacional e econômico foi sempre voltado para a atividade mineradora. A empresa Vale, inclusive, está presente desde 1985, antes mesmo da criação oficial do município, que foi em 1988. Ao andar pela cidade, é comum encontrar pessoas que nasceram em outros estados, em especial do Maranhão, e que se mudaram em função de emprego diretamente ou indiretamente relacionado à mineração.

A auxiliar administrativa Yarena Kauana, 24 anos, nasceu em São Luís, no Maranhão, e se mudou para Parauapebas na infância, quando os pais migraram em busca de emprego. Hoje casada e com um filho pequeno, ela reflete sobre as mudanças que viu na cidade: "É meu lar agora. Parauapebas tem crescido e ainda tem muita oportunidade de trabalho, mas acho importante investir em mais espaços de lazer para frequentar com a família e no turismo, para que a cidade que meu filho veja daqui a uns anos seja mais possível de desfrutar".