Queimadas em Novo Progresso, Pará - Foto: Fernando Souza - AGIF-AE/arquivo
OPINIÃO

Em busca de segurança climática: o que a Amazônia tem a ver com isso?

Professor da Universidade Estadual do Pará e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Aiala Colares Couto

25/11/2022

Talvez nunca a Amazônia tenha sido tão falada em uma Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas como esta que ocorreu no Egito, de 6 a 18 de novembro, na cidade de Sharm El-Sheikh. No evento, o consórcio dos estados da Amazônia lançou o Projeto Rural Sustentável (PRS-Amazônia), com vistas a desenvolver uma agricultura com baixo carbono. Na verdade, esta já é uma demanda que chama a atenção para o debate acerca da segurança climática.

É pertinente compreendermos a relação entre clima e segurança, pois ela parte de vários aspectos com os mais variados significados, mas, em sua essência, se define a partir da relação sociedade e natureza na busca de um modelo sustentável. Em outras palavras, busca-se diminuir as taxas de desmatamento e queimadas na região, pois, proteger a floresta amazônica é uma questão não apenas de segurança humana e sim de segurança planetária.

As mudanças climáticas promovem uma série de catástrofes que têm como resultado: a insegurança alimentar agravada pelas secas, os deslocamentos forçados por conta da escassez de água, infertilidade do solo e enchentes, e a intensificação de conflitos que se dão pelo controle dos recursos naturais. Ou seja, o aquecimento do planeta vem comprometendo a vida na terra, sua biodiversidade e suas populações, e, em relação a Amazônia, nos encontramos bastante vulneráveis em relação à presença de atividades econômicas que desrespeitam os limites da natureza e afetam o modo de vida.  

Uma mudança de postura torna-se necessária, sobretudo, com a participação dos estados e do governo federal, um esforço coletivo para frear o desmatamento e construir oportunidades que valorizem a floresta em pé. O Instituto Homem e Meio Ambiente (Imazon) revelou que, atualmente, o Pará é o estado que apresenta a maior taxa de desmatamento da Amazônia Legal: só para se ter uma noção real da dimensão do problema, de agosto de 2021 a julho de 2022 foram derrubadas 3.858 km² de florestas, o que equivale a 36% do total da região amazônica. Os municípios de Altamira, Itaituba, São Félix do Xingu e Uruará estão entre os mais desmatados, somando juntos 259 km² de área destruída, o que representa 44% do território paraense.

Amazonas, Mato Grosso, Acre e Rondônia e Roraima também seguem elevando suas taxas de desmatamento. Isso ainda é reflexo de uma capacidade limitada de governança, onde as instituições responsáveis por investigar e punir não o fazem, ou por contarem com poucos agentes para darem conta de uma vasta região como a Amazônia, ou devido interferências do governo federal que fragilizam as ações de combate aos crimes ambientais, como ocorreu nestes últimos anos. 

De qualquer forma, as queimadas criminosas e o desmatamento ilegal que alimenta o contrabando de madeira devem ser enfrentados como garantia dos estados em terem compromissos com a justiça ambiental e com a segurança climática do planeta. Não só isso, mas há também que se considerar a participação dos povos tradicionais nos processos decisórios, visto que, entendemos que indígenas, quilombolas, ribeirinhos, castanheiros e seringueiros podem sim ser enxergados como os guardiões da floresta. Potencializar essas atividades ecologicamente sustentáveis é dar garantias de direitos sobre a terra e garantia de manutenção da biodiversidade.

Na COP, o painel brasileiro montado pela sociedade civil organizada reuniu os povos da floresta amazônica e de outros biomas, aglutinando-os com o Movimento Negro Brasileiro e os mais variados movimentos sociais, coletivos, ativistas da questão ambiental e representantes das organizações não governamentais.

Isso é a COP-27 ou Conferência das Partes (COP sigla em inglês), evento que tem a capacidade de reunir governos, diplomatas, pesquisadores, sociedade civil e entidades privadas, todos trazendo reflexões e debates sobre soluções para a crise climática global. O Brasil é uma das 197 nações que concordaram com o pacto ambiental da Organização das Nações Unidas (ONU) desde 1990, quando, então, assinou o tratado de Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, cuja principal meta seria estabilizar a emissão de gases do efeito estufa na atmosfera.

Mas o que a Amazônia tem a ver com isso? A Amazônia tem tudo a ver com isso. Ainda somos a região que, mesmo diante de todas as catástrofes ambientais e crimes que são cometidos contra seus povos, detém uma rica biodiversidade, em função da variedade de espécies encontradas e sua fauna e flora. É, também, a maior floresta do mundo, com um rico ecossistema, com mais de 40 mil espécies de plantas, árvores e flores. Milhares de espécies ainda nem catalogadas pelos cientistas e muitas nem ainda conhecidas. Além de tudo isso, a Bacia Amazônica se constitui enquanto o maior sistema hidrográfico do planeta e cobre uma área equivalente a um território continental sendo responsável por 16% da água doce que chega aos oceanos.

A Amazônia, então, tem tudo a ver com a segurança climática do planeta. Não é à toa que o mundo está preocupado com a nossa região, nos tornamos um problema global, e assegurar a existência de toda esta riqueza destacada é, antes de tudo, ter coragem para mudar de paradigmas desenvolvimentistas. Em minha concepção, este é o maior desafio que temos pela frente, o de convencer à mudança de posturas e, ao mesmo tempo, termos alternativas ecologicamente sustentáveis que possam, enfim, promover a justiça social e ambiental.