Com a COP30 acontecendo esse mês em Belém, a adaptação às mudanças climáticas ganha destaque como um dos temas centrais da conferência. Mas o que significa realmente adaptar-se ao clima em transformação? E como esse conceito se relaciona com resiliência, termo também frequente nas discussões climáticas?
Adaptação refere-se às ações concretas que tomamos para ajustar nossa vida aos efeitos do clima em transformação. São medidas práticas e urgentes: construir barreiras contra enchentes, instalar novos sistemas de irrigação, plantar árvores para resfriar áreas urbanas. Em Bangladesh, por exemplo, criadores substituíram galinhas por patos nas regiões alagáveis, uma solução simples, mas eficaz, já que patos nadam durante as cheias. Aqui na Amazônia, na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, indígenas Tupinambá transformam áreas degradadas por incêndios florestais em florestas sociais, combinando a regeneração natural com o plantio de espécies úteis às comunidades, como açaí e cacau.
Resiliência, por sua vez, é nossa capacidade de antecipar choques climáticos, enfrentá-los e nos recuperar com o mínimo de danos. É uma visão mais ampla, que exige mudanças sistêmicas em políticas, infraestrutura, educação e planejamento. Não basta reagir: precisamos fortalecer as comunidades com capacidade social, econômica e ambiental para absorver e superar crises.
Essa distinção é importante porque a adaptação pode tanto fortalecer quanto minar a resiliência. Grandes obras de engenharia, como barragens, podem criar falsa sensação de segurança e reduzir outras estratégias de prevenção.
Agricultores que investem pesadamente em irrigação podem resistir a abandoná-la mesmo quando se torna ineficiente. Isso acontece porque tendemos a valorizar mais o que já gastamos do que novas alternativas: quem investiu muito dinheiro e esforço em determinada solução reluta em mudá-la, mesmo quando ela deixa de funcionar bem. Por isso, a resiliência combina três capacidades essenciais: absorver impactos imediatos, adaptar-se às mudanças e, quando necessário, transformar estruturas profundas. Enquanto a adaptação busca ajustes dentro do sistema existente, a transformação exige repensar radicalmente como organizamos cidades, produzimos alimentos e vivemos.
Alguns exemplos ilustram bem essa diferença. Uma estratégia de adaptação informada pelo pensamento de resiliência não se limita a construir muros: analisa riscos, reduz vulnerabilidades, prepara respostas e fortalece capacidades de recuperação por meio de mecanismos ambientais, financeiros, sociais e políticos. Porém, há incertezas inevitáveis nesse processo. Deslocar comunidades costeiras resolve o problema das enchentes, mas pode inviabilizar a pesca. Reflorestar áreas degradadas pode recuperar carbono, mas sem restaurar ecossistemas, pode comprometer as funções ecológicas da floresta. O clima muda, a economia muda, e uma estratégia adaptativa pode se tornar inadequada com o tempo.
Compreender essas nuances será fundamental nas discussões da COP30, onde adaptação e resiliência estarão no centro dos debates sobre financiamento climático e cooperação internacional. Precisamos de planejamento de longo prazo, transformador e holístico, que vá além de soluções pontuais e reativas, para enfrentar um futuro climático cada vez mais desafiador.
Ima Vieira é pesquisadora titular do Museu Paraense Emilio Goeldi e assessora da FINEP. Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências