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JORNADA PELO CLIMA

Embrapa leva tecnologias sustentáveis à COP 30

DISCUSSÕES - Instituição apresentará documento com propostas para os negociadores brasileiros e mostrará suas pesquisas durante o período do evento

Ádria Azevedo | Especial para O Liberal

29/06/2025

Uma pesquisa, parceria entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Amazônia Oriental e a Universidade Federal do Pará (UFPA), descobriu as propriedades anti-inflamatórias e cicatrizantes do própolis produzido pelas abelhas-canudo, sem ferrão e nativas da Amazônia. O estudo foi um desdobramento da investigação da Embrapa sobre a eficiência da espécie na polinização do açaizeiro, que constatou produção elevada de própolis de alta qualidade. 


As tecnologias descritas acima são apenas alguns exemplos do que será mostrado na AgriZone, a Casa da Agricultura Sustentável Brasileira, que será montada na Embrapa Amazônia Oriental, em Belém, durante o período da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30), de 10 a 21 de novembro deste ano. A AgriZone será a culminância de uma programação iniciada em maio pela sede nacional da Embrapa, denominada “Jornada pelo Clima”.

 


O projeto é uma campanha com ações de comunicação, discussões preparatórias e uma grande exposição sobre agricultura sustentável, a AgriZone. A iniciativa parte do princípio de que a ciência tem papel fundamental na construção de sistemas agroalimentares mais sustentáveis, adaptados e resilientes, que possam diminuir a emissão de gases do efeito estufa, preservar os biomas e promover a inclusão socioprodutiva.

INTEGRAÇÃO

 

Nesse sentido, a Jornada iniciou em 7 de maio, com a realização do primeiro evento “Diálogos pelo Clima”, em Brasília, reunindo governo, setor produtivo, academia, sociedade civil e demais atores envolvidos com a temática da agricultura e mudanças climáticas. Além do primeiro encontro, já foram realizadas reuniões em Cuiabá (MT) e Corumbá (MS). Ainda estão previstos Diálogos em Manaus (AM), em julho; em Porto Alegre (RS), em agosto; em Fortaleza (CE), em setembro; e em São Paulo (SP), em outubro; cada um discutindo os respectivos biomas onde ocorrem. 

 

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De acordo com Ana Euler, diretora de Inovação, Negócios e Transferência de Tecnologia da Embrapa, a Jornada “reflete décadas de pesquisa e compromisso da Empresa com o meio ambiente, aliando inovação tecnológica à responsabilidade social e ambiental (Foto: Ascom Embrapa)

 

Além disso, uma página especial da Embrapa sobre a COP 30 (www.embrapa.br/cop30) agrega vídeos, materiais educativos e uma vitrine virtual de tecnologias. A Empresa também levará o “Espaço do Clima” para diversas feiras agropecuárias que acontecem pelo país até a Conferência.


A ideia é, a partir das discussões, coletar visões e contribuições dos participantes para construir um documento-síntese, que deverá orientar políticas públicas e os negociadores brasileiros na COP 30 a respeito da agropecuária brasileira e suas iniciativas sustentáveis.


De acordo com Ana Euler, diretora de Inovação, Negócios e Transferência de Tecnologia da Embrapa, a Jornada “reflete décadas de pesquisa e compromisso da Empresa com o meio ambiente, aliando inovação tecnológica à responsabilidade social e ambiental. Com olhar no presente e no futuro, a Embrapa dedica-se a promover uma agricultura que não apenas resista às adversidades do clima, mas que seja parte ativa da solução global para o enfrentamento das mudanças climáticas”, pontua.

Soluções buscam a adaptação da agropecuária

 

Na página especial da Embrapa sobre a COP 30, está disponível uma vitrine de tecnologias já desenvolvidas pela instituição. “São soluções inovadoras e estratégicas voltadas para a adaptação da agropecuária aos desafios impostos pela mudança climática. 

 

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Sistema agroflorestal com açaí e cacau é uma das tecnologias sustentáveis estudadas pela Embrapa (Foto: Ronaldo Rosa/Ascom Embrapa)

 

As abordagens apresentadas envolvem vários eixos: Adaptação e Resiliência Climática, com tecnologias focadas em fortalecer os sistemas produtivos frente a eventos climáticos extremos; Agricultura de Baixo Carbono, que buscam mitigar os impactos da agropecuária por meio da redução de emissões e aumento da fixação de carbono no solo; Segurança Alimentar e Nutricional, com tecnologias que garantem o acesso contínuo a alimentos saudáveis e de qualidade; Bioeconomia e Economia Circular, que transformam resíduos e biomassa em novos produtos e energia; Redução da Pressão sobre Florestas e Biomas, que propõe práticas regenerativas e intensificação sustentável; e Inclusão Socioprodutiva e Digital, que busca levar capacitação, soluções digitais e tecnologias sociais aos produtores rurais”, detalha Ana Euler.


Parte dessa vitrine deve ser apresentada na AgriZone, durante a COP 30, na Embrapa Amazônia Oriental, que fica a apenas dois quilômetros de distância da sede da Conferência, que acontecerá no Parque da Cidade. A programação foi composta a partir de um edital, aberto para interessados em propor eventos dentro da AgriZone. “A AgriZone será uma instalação montada durante a COP 30 que visa destacar as iniciativas e inovações do Brasil no campo da agricultura sustentável. A Casa da Agricultura Sustentável Brasileira será um espaço dedicado a promover as soluções tecnológicas do país voltadas para a sustentabilidade, além de demonstrar como o Brasil está lidando com os desafios climáticos no setor agrícola. Será um ponto de encontro onde especialistas, pesquisadores e instituições do mundo inteiro se reunirão para discutir soluções inovadoras para enfrentar a crise climática, com ênfase nas práticas agrícolas sustentáveis”, explica Ana Euler.

 

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"Nosso desejo é que os negociadores da Conferência possam se conectar com nosso espaço e participar dessa discussão de conhecimentos técnicos na AgriZone. Pretendemos mostrar como as tecnologias dialogam para fortalecer a Amazônia nesse papel de enfrentamento às mudanças climáticas", diz com Walkymário Lemos, chefe-geral da Embrapa Amazônia Oriental (Foto: Ascom EmbrapaP

INSERÇÃO

 

De acordo com Walkymário Lemos, chefe-geral da Embrapa Amazônia Oriental, a proposta é que a AgriZone seja uma parte conectada à dinâmica da COP 30. “Nosso desejo é que os negociadores da Conferência possam se conectar com nosso espaço e participar dessa discussão de conhecimentos técnicos na AgriZone. Pretendemos mostrar como as tecnologias dialogam para fortalecer a Amazônia nesse papel de enfrentamento às mudanças climáticas. Algo relevante que traremos é o grande potencial de se produzir alimentos em áreas com fortes impactos da ação humana”, aponta Lemos. 


“A Amazônia tem muitas áreas em diferentes processos de degradação que podem ser trabalhadas com sistemas sustentáveis, capazes não apenas de recuperar o ambiente, mas também produzir alimento por meio de uma recomposição produtiva”, complementa.


Segundo o chefe-geral, a expectativa é que todo tipo de público participe: negociadores, pesquisadores, organizações não-governamentais e população em geral. “Queremos que seja um grande espaço de congregação de quem se interessa em conhecer tecnologias sustentáveis para se produzir alimento, manter a floresta em pé e reduzir a emissão de gases do efeito estufa”, afirma.


De acordo com Lemos, alguns exemplos de tecnologias desenvolvidas pela própria Embrapa Amazônia Oriental e que serão mostradas no espaço serão os sistemas agroflorestais em suas diferentes formações e desenhos, como consórcio entre açaí e cacau ou café e cacau; a integração lavoura-pecuária-floresta; e restaurações ambientais em suas diferentes perspectivas. “São exemplos de sistemas reconhecidamente testados para condições amazônicas, ofertando, portanto, condições de produzir alimento, preocupando-se com as emissões”, lembra.

 

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O agrônomo Daniel Santiago estuda a polinização do açaizeiro pelas abelhas-canudo e produção de própolis pela espécie (Foto: Ronaldo Rosa/Ascom Embrapa)

Polinização é opção para a sociobiodiversidade

 

No espaço, será apresentado o estudo sobre a polinização do açaizeiro pelas abelhas-canudo e produção de própolis pela espécie, citado no início desta reportagem. Daniel Santiago, engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa responsável pela investigação, esclarece que a pesquisa pretende contribuir para a valorização de produtos sustentáveis da Amazônia, impulsionando a sociobiodiversidade.


Santiago conta que já faz uma década que a Embrapa Amazônia Oriental realiza pesquisas sobre o comportamento de abelhas sociais que ocorrem naturalmente no estado do Pará. “Esses estudos determinaram que as abelhas-canudo têm tamanho adequado às flores do açaizeiro e visitam tanto as flores masculinas quanto as femininas, realizando a polinização. Foi verificado um impacto médio de 35% de aumento da produtividade do açaí com a introdução de colmeias da espécie nas áreas de cultivo”, relata o pesquisador. 


Ele complementa que a estratégia de uso dos insetos polinizadores se desenvolve muito melhor em sistemas sustentáveis como os agroflorestais, onde há manutenção das florestas ao redor das áreas de cultivo.

 

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A pesquisa constatou também que as abelhas canudo são grandes produtoras de própolis (Foto: Vinícius Braga/Ascom Embrapa)

PRÓPOLIS

 

As abelhas-canudo costumavam ser pouco valorizadas pelos meliponicultores paraenses, pela sua baixa produção de mel, mas, agora, ganharam maior espaço, por conta de seu potencial de polinização do açaizeiro. A pesquisa constatou também que a espécie é grande produtora de própolis. Em um desdobramento do estudo, em parceria com a UFPA, descobriu-se ainda que produtos feitos a partir desse própolis, como pomadas, têm alto poder cicatrizante e anti-inflamatório, comparável a pomadas cicatrizantes disponíveis no mercado, porém mais sustentáveis, já que são produzidas a partir de sistemas agrodiversos amazônicos.


Santiago adianta que produtores que aderiram a essas tecnologias e que já se tornaram multiplicadores do conhecimento terão espaço para mostrar seu trabalho na AgriZone. É o caso da família Amante Pinon, de Breu Branco, que já utiliza o própolis da abelha-canudo na produção de cosméticos.

 

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Extração de própolis das abelhas canudo. A substância tem alto poder cicatrizante e anti-inflamatório (Foto: Vinícius Braga/ Ascom Embrapa

REFLORESTAMENTO

 

A produtora rural e empresária Carmélia Amante Pinon conta que sua família era produtora de gado de leite, mas que, com a chegada do novo Código Florestal, precisou se adaptar à necessidade de reflorestar as áreas de proteção permanente de sua propriedade. 


“Fizemos o reflorestamento com açaí, andiroba, cacau, taperebá e outras plantas e agora fazemos o manejo das abelhas e a produção de cosméticos”, relata. “A Embrapa veio à nossa propriedade fazer a pesquisa do mel monofloral do açaí e começamos a introduzir as abelhas sem ferrão. O Daniel Santiago nos ensinou a fazer os coletores de própolis e temos tido excelentes resultados nas pessoas que estão utilizando nossos cosméticos”, completa Carmélia. 

 

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A produtora rural e empresária Carmélia Amante Pinon conta que sua família era produtora de gado de leite, mas reflorestou sua propriedade, usando abelhas polinizadoras, como as canudo. O própolis coletado é usado na produção de pomadas (Foto: Arquivo pessoal)


Hoje, a família se tornou multiplicadora da prática. “Montamos um meliponário na escola do meu filho e também no Instituto Federal do Pará (IFPA) de Tucuruí. O objetivo é treinar jovens e incentivar a preservação e a sustentabilidade. E aprendemos na prática que preservar não é apenas proteger a natureza, mas também fonte de renda para a nossa família. Antes, tínhamos uma fonte de renda na propriedade; hoje, temos cinco. Temos muito a ganhar quando fortalecemos a bioeconomia”, conclui a produtora.

 

PARCERIA INSTITUCIONAL
A produção da Liberal Amazônia é uma das iniciativas do Acordo de Cooperação Técnica entre o Grupo Liberal e a Universidade Federal do Pará. Os artigos que envolvem pesquisas da UFPA são revisados ​​por profissionais da academia. A tradução do conteúdo também é assegurada pelo acordo, por meio do projeto de pesquisa ET-Multi: Estudos da Tradução: multifaces e multissemiótica.