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IMPACTO

Negócios preservam o que a Amazônia tem de melhor

OPORTUNIDADES - Incubadoras e aceleradoras da paraense UFPA e dos amazoneses Idesam e Faz impulsionam negócios sustentáveis

Ádria Azevedo | Especial para O Liberal

20/12/2024

A Amazônia tem uma grande potencialidade para a criação e desenvolvimento de novos negócios, sobretudo envolvendo a sociobiodiversidade e a inovação. São os chamados “negócios de impacto”, que geram efeito socioambiental positivo, desenvolvendo soluções para problemas locais, mantendo a floresta em pé e gerando riqueza para seus habitantes. 

 

Porém, nem sempre é fácil começar um novo negócio, em especial na região, onde os desafios logísticos, infraestruturais e de acesso a conhecimento podem ser enormes. Daí a importância de iniciativas como as incubadoras e aceleradoras de negócios nela instaladas: elas apoiam pequenas empresas com recursos e suporte técnico e gerencial, para ajudar em sua formação e crescimento.

 


Hoje a Amazônia conta tanto com incubadoras quanto com aceleradoras, sejam elas ligadas a instituições governamentais ou a organizações da sociedade civil, com financiamentos públicos ou de investidores privados.

UNIVERSIDADE

 

Uma das primeiras incubadoras criadas na região foi a da Universidade Federal do Pará (UFPA), por meio do Programa de Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (Piebt). A iniciativa, com sede no campus universitário do Guamá, em Belém, nasceu em 1995 para desenvolver negócios a partir da biodiversidade amazônica, mas, com o tempo, abriu o leque de áreas atendidas. 


Em quase 30 anos de existência, já apoiou negócios de mineração, energia, indústria da transformação, software, bioeconomia, fármacos e produtos naturais. “A Incubadora trabalha com qualquer negócio que tenha como objetivo um produto, processo ou serviço inovador, independentemente da área de conhecimento. A biodiversidade continua sendo uma área preferencial, mas os negócios foram ampliados para as áreas de tecnologia e inovação”, aponta Iara Neves, coordenadora da iniciativa. Até o momento, já foram apoiadas mais de 60 empresas.

 

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“A Incubadora trabalha com qualquer negócio que tenha como objetivo um produto, processo ou serviço inovador, independentemente da área de conhecimento", aponta Iara Neves, coordenadora do Programa de Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (Piebt), da Universidade Federal do Pará (UFPA) (Foto: Thiago Gomes/O Liberal)

CUMARU

 

Atualmente, são incubadas na UFPA empresas nas áreas de bioeconomia. Uma delas é a Ju Carepa, que desenvolve produtos à base de cumaru. A fundadora do empreendimento, Juliana Carepa, resolveu apostar nessa semente regional, depois de uma experiência com a produção de doces com ingredientes amazônicos.


“Quando trabalhava com doces e biscoitos, o que mais fazia sucesso era o de cumaru. Então, comecei a estudar o mercado. Fiz pessoalmente o mapeamento da cadeia, conheci cada produtor que me fornece. São agricultores familiares e extrativistas de Santarém, Mojuí dos Campos, Óbidos e Oriximiná, no Oeste do Pará”, explica a empreendedora. 

 

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Juliana Carepa fundou a JuCarepa, empresa que desenvolve produtos à base de cumaru (Foto: Thiago Gomes/O Liberal)


O resultado é a produção da semente desidratada, do cumaru em pó e da pasta de cumaru, chamada de caramelo. “O cumaru é muito utilizado como substituto da baunilha, porque é extremamente cheiroso, mas também tem muitos benefícios, como antioxidante e anti-inflamatório”, detalha Juliana.


Segundo a empresária, o trabalho com o cumaru garante geração de renda para as comunidades agricultoras e extrativistas e ajuda na preservação. “A extração do cumaru ocorre assim: o fruto cai da árvore e só então é aberto e sua semente retirada. Ou seja, só existe extração de cumaru com a floresta em pé. Ao mesmo tempo que se agrega valor ao fruto e à semente, se estimula que a floresta seja preservada, porque isso será vantagem para a comunidade”, pondera.

Oferta de infraestrutura e capacitação é contínua na UFPA

 

Para Juliana Carepa, estar dentro da Incubadora da UFPA é essencial. “Aqui temos o apoio do espaço físico, para o registro de marca e na interlocução com pesquisa e inovação”, explica.

 

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De acordo com Juliana Carepa, a Incubadora da UFPA fornece o apoio do espaço físico, para o registro de marca e na interlocução com pesquisa e inovação (Foto: Thiago Gomes/O Liberal)


A coordenadora da incubadora da UFPA, Iara Neves, esclarece que a incubação inclui dois tipos de apoio: a cessão de um espaço físico, dentro da própria sede da iniciativa; e um pacote de serviços para o desenvolvimento estratégico do negócio, com orientações gerenciais, financeiras, mercadológicas.


“Além disso, tem uma vantagem muito grande, que é o ‘selo UFPA’. É muito forte um empreendimento dizer que é apoiado pela maior universidade da região Norte. Dá credibilidade”, afirma a administradora.

SELEÇÃO

 

Para concorrer a uma vaga na Incubadora da UFPA, a empresa interessada deve submeter sua proposta de acordo com critérios de edital. Desde 2018, o fluxo de entrada é contínuo, ou seja, não há um período específico para abertura de inscrições: basta submeter a ideia. Um dos principais critérios, que aumenta a pontuação, é que seja um negócio que resolva problemas sociais e ambientais.

 

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“O objetivo é fomentar que negócios de impacto criem uma nova economia na Amazônia, a partir do uso sustentável da floresta e da geração de renda para comunidades", diz Gabriela Souza, gestora de Operações da Amaz (Foto: Rodrigo Duarte/AMAZ)


Já a Amaz - Aceleradora de Impacto, coordenada pelo Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), organização não governamental (ONG) amazonense, tem chamadas anuais para inscrição de novos negócios, geralmente abertas no primeiro trimestre do ano.

ONG estimula nova economia para a região

 

De acordo com Gabriela Souza, gestora de Operações da Amaz, a aceleradora surgiu em 2021 a partir da experiência prévia do Idesam em acelera e incubar negócios da sociobiodiversidade amazônica. 


“O objetivo é fomentar que negócios de impacto criem uma nova economia na Amazônia, a partir do uso sustentável da floresta e da geração de renda para comunidades. Desde o lançamento de nosso primeiro fundo até o primeiro semestre de 2024, avaliamos mais de 500 potenciais negócios, aceleramos 17 e investimos em 14 negócios de impacto que atuam na região. Esses negócios apoiam a conservação ou restauração de 633.399 hectares de floresta nativa e geram renda para mais de 750 famílias”, enumera a gestora. 


Gabriela Souza explica que a aceleradora trabalha junto com os empreendedores na construção, execução e direcionamento de estratégias de crescimento. Isso inclui oficinas, assessorias e mentorias voltadas a aprimorar as estratégias de gestão, comercial, de comunicação, de relacionamento e de captação de investidores.


O portfólio atual da AMAZ inclui 15 negócios, nos setores de produtos alimentícios, cosméticos, turismo de base comunitária, serviços de restauração florestal, logística e artesanato.

 

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Zeno Nativo, empresa especializada na comercialização de castanha-do-Pará e de amêndoa de cacau nativo, teve um boom de crescimento por meio do apoio da Amaz (Foto: Coi Belluzzo)

IMPACTO

 

Um deles é o Zeno Nativo, do Acará, no nordeste paraense, chefiado por Zeno Gemaque. A empresa, especializada na comercialização de castanha-do-Pará e de amêndoa de cacau nativo, teve um boom de crescimento por meio do apoio da Amaz. 


“Ao receber o aporte financeiro, fizemos ampliação da fábrica, compra de equipamentos, aumento da capacidade produtiva. Também fomos ajudados com a trilha estratégica, assessoria jurídica e contábil, contatos. Temos mais capacidade de avançar e aumentar nosso impacto no território. A Amaz acelerou um processo que levaríamos anos para conseguir”, avalia Gemaque.


O impacto a que o empresário se refere inclui não apenas a compra de matéria-prima diretamente das comunidades locais, como também o estímulo à conservação florestal. “Trabalhamos por meio de parcerias, com 250 produtores de cacau e castanha. Nossa principal contribuição foi apontar uma outra alternativa de renda dentro do território”, afirma.

 

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A Zeno Nativo trabalha por meio de parcerias, com 250 produtores de cacau e castanha (Foto: Coi Belluzzo)


Segundo Gemaque, antes da Zeno Nativo, a principal fonte de renda na região era a produção de mandioca e de açaí, com a derrubada da floresta para plantio de monocultura. 

 

“Castanha e cacau eram muito baratos, nem tinha para quem vender. Então, a gente entrou comprando castanha e pagando um preço mais justo. Com a compra garantida para esse produtor, ele se sente mais confiante para manter a sua castanheira em pé, porque sabe que vai conseguir vender e por um preço interessante. E o cacau, as pessoas começaram a pegar as sementes dos cacaueiros nativos e replicar, fazendo agroflorestas. A gente só consegue mudar a realidade quando as pessoas percebem que manter a floresta em pé pode ser lucrativo”, afirma.

 

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"Nossa principal contribuição foi apontar uma outra alternativa de renda dentro do território”, afirma Zeno Gemaque (Foto: Coi Belluzzo)

FAS apoia negócios em unidades de conservação

 

Uma outra iniciativa é a Incubadora de Negócios da Floresta, da ONG amazonense Fundação Amazônia Sustentável (FAS). Criada em 2013, ela surgiu para apoiar empreendimentos comunitários na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Rio Negro, mas atualmente já atende seis unidades de conservação diferentes.


Com suporte aos empreendimentos na área gerencial, técnica, infraestrutural, de qualificação profissional, de desenvolvimento de produtos e de acesso a mercados e investimentos, a incubadora atualmente apoia sete negócios, em segmentos como turismo, alimentação e cadeias produtivas do cacau e do pirarucu.


“O apoio fornecido tem sido crucial para que pequenos empreendimentos comunitários ganhem impulso inicial, permitindo que alcancem maturidade, gerem renda e melhorem a qualidade de vida dos moradores locais”, destaca Wildney Mourão, gerente do programa de Empreendedorismo e Negócios Sustentáveis da Amazônia da FAS. Cerca de 300 famílias de comunidades tradicionais já foram impactadas.

 

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“O apoio fornecido tem sido crucial para que pequenos empreendimentos comunitários ganhem impulso inicial, permitindo que alcancem maturidade, gerem renda e melhorem a qualidade de vida dos moradores locais”, destaca Wildney Mourão, da FAS (Foto: Arquivo pessoal)

GASTRONOMIA

 

Uma dessas comunidades é a Três Unidos, do povo indígena Kambeba, na Área de Protecão Ambiental do Rio Negro. No local, a indígena Neurilene Cruz comanda o restaurante Sumimi, especializado em comidas regionais.


“Eu trabalho com comida tradicional, a pupeca, a mojica, que são comidas indígenas, e mesmo específicas do povo kambeba, como o fani. Tenho também o tambaqui assado, as farofas de banana e da casca da macaxeira, pratos bem regionais”, detalha Neurilene. 


De acordo com a empresária, o apoio da incubadora foi fundamental para a profissionalização dos serviços, para a melhoria da infraestrutura e para ampliar a visão de mercado. “A FAS foi uma das principais ONGs a nos trazer essa visão de que era importante ter um restaurante, uma pousada dentro da comunidade. A gente foi abrindo os olhos e isso gerou oportunidade”, relata. Hoje, a comunidade é referência em turismo de base comunitária na região.

 

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De acordo com Neurilene Cruz, do Restaurante Sumimi, o apoio da incubadora da FAS foi fundamental para a profissionalização dos serviços, para a melhoria da infraestrutura e para ampliar a visão de mercado (Foto: Arquivo pessoal)


Segundo Neurilene, o restaurante Sumimi, que recebe clientes de todo o Brasil e também de outros países, representa o fortalecimento de sua cultura e do empoderamento feminino, já que as trabalhadoras são todas mulheres. “Você ali não está apenas mostrando o seu talento na cozinha: você está mostrando sua cultura, sua vivência, seu costume. Você está dando seu valor para a comunidade e isso nos fortalece a cada dia”.

 

PARCERIA INSTITUCIONAL
A produção do Liberal Amazon é uma das iniciativas do Acordo de Cooperação Técnica entre o Grupo Liberal e a Universidade Federal do Pará. A tradução do conteúdo é realizada pelo acordo, através do projeto de pesquisa ET-Multi: Estudos da Tradução: multifaces e multisemioses.