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OPINIÃO

Ciência e tecnologia para o desenvolvimento da Amazônia

Emmanuel Tourinho

Professor Titular da Universidade Federal do Pará, onde exerce a função de Reitor. Doutor em Psicologia Experimental pela USP. Membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia. Foi Presidente da ANDIFES, Presidente do Comitê Assessor da Área de Psicologia do CNPq e Coordenador da Área de Psicologia na CAPES.

29/07/2022

Os contrastes perturbadores da realidade amazônica, como entre as riquezas naturais e a pobreza dos povos, entre projetos energéticos e minerais de grande escala e a falta de saneamento básico e água tratada para a maior parte da população, expressam alguns dos limites do modelo de desenvolvimento que predominou na região em um passado recente e que agora demanda mudanças. Quanto a isso, há razoável concordância entre governos e organizações da sociedade. Também a noção de desenvolvimento sustentável parece não ser fonte de controvérsia entre os que discutem o futuro da região. O papel da Amazônia para o clima global adiciona à equação a necessidade de conservação das florestas e de todo o bioma amazônico. Nada disso é possível sem o uso intensivo de ciência e tecnologia e sem a participação ativa das populações locais. É preciso conhecer a biodiversidade amazônica para dela tirar proveito sustentável, desenvolvendo produtos que atendam às necessidades locais e globais. E é preciso ter as populações locais como protagonistas e beneficiárias diretas dos resultados de novos projetos, garantindo o seu papel na conservação das florestas. Sobre essas duas exigências, estão por ser construídos consensos e, mais do que isso, ações concretas.

Até há bem pouco tempo, no máximo duas décadas, faltavam à Amazônia recursos humanos em ciência e tecnologia com a qualificação e a dimensão compatíveis com o desafio de conhecer e aproveitar de modo sustentável as riquezas locais. Faltavam também as estruturas de ciência – laboratórios, equipamentos, insumos e relações de cooperação com laboratórios externos para a pesquisa necessária. Nos dois casos – ainda que mais no primeiro do que no segundo, houve avanços muito significativos nos últimos anos. As instituições universitárias e os institutos de pesquisa instalados na região formam, todo ano, centenas de mestres e doutores (em 2020, foram mais de três mil e seiscentos), frequentemente em laboratórios e projetos que lidam diretamente com os problemas mais desafiadores da Amazônia. Essa capacidade agora instalada, no entanto, encontra-se parcialmente ociosa, pois carece dos meios (financiamentos) para ser plenamente aproveitada.

 Ainda que documentos oficiais brasileiros das áreas de pesquisa e pós-graduação falem sempre da Amazônia como possível prioridade nacional, nenhum grande esforço tem sido feito na direção do suporte e fortalecimento dos grupos de pesquisa instalados na região. Esses grupos, como regra mais jovens, disputam recursos com estruturas de pesquisa consolidadas em outras regiões e muitas vezes são preteridos, sobretudo nos tempos atuais de orçamentos reduzidos. Organizações internacionais que se voltam para a Amazônia, também, com frequência, destinam recursos a atores sociais que trabalham em favor da conservação das florestas, mas não visualizam as universidades e institutos de pesquisa aqui instalados como parceiros potenciais.

Há ciência de altíssima qualidade e relevância sendo desenvolvida na Amazônia, por grupos instalados nas instituições da Amazônia, que trabalham com problemas da realidade amazônica, interagindo com as populações da Amazônia. É muito positivo que assim seja. Uma mobilização para fortalecer esses grupos e aproveitar todo o seu potencial fará muito bem ao desenvolvimento sustentável da região, à garantia de direitos a seus povos e à conservação de suas florestas.