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Discurso

Lula diz que será mais "cobrador" de países ricos sobre acordo climático

Durante agenda oficial da COP 27, no Egito, presidente eleito também destacou a Amazônia em seu pronunciamento

Daniel Nardin

Direto de Sharm El-Sheikh, Egito

17/11/2022

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva fez do seu pronunciamento na 27a Conferência das Nações Unidas para o Clima, em Sharm El-Sheikh, no Egito, na quarta-feira (16) um momento para dar o tom que pretende adotar nas relações internacionais a partir do início do seu mandato, em janeiro de 2023. Ele propôs um “pacto global contra a fome” e disse que será mais “cobrador” dos países ricos para o pagamento de recursos contra a mudança climática aos países em desenvolvimento, como o Brasil, conforme acordado em 2009 e que “até agora não foi cumprido”, disse Lula. Ele também reafirmou compromissos de campanha, de combate a ilegalidades na Amazônia, defendeu investimentos de fundos internacionais na região, mas que o país não irá abrir mão de sua soberania.

Sobre o tom mais duro em relação aos países mais ricos, Lula disse que não voltou para fazer o mesmo e que irá buscar fazer mais. “Por isso, esperem um Lula mais cobrador para que a gente possa fazer um mundo mais justo e humanamente melhor para todos nós”, disse.

Segundo Lula, em 2009, “os países presentes à COP 15, em Copenhague, comprometeram-se em mobilizar 100 bilhões de dólares por ano, a partir de 2020, para ajudar os países menos desenvolvidos a enfrentarem a mudança climática. Este compromisso não foi e não está sendo cumprido. Isso nos leva a reforçar, ainda mais, a necessidade de avançarmos em outro tema desta COP 27: precisamos com urgência de mecanismos financeiros para remediar perdas e danos causados em função da mudança do clima”, afirmou.

Para Lula, o debate não pode mais ser adiado. “Não podemos mais adiar esse debate. Precisamos lidar com a realidade de países que têm a própria integridade física de seus territórios ameaçada, e as condições de sobrevivência de seus habitantes seriamente comprometidas. É tempo de agir. Não temos tempo a perder. Não podemos mais conviver com essa corrida rumo ao abismo”, comentou.

Ainda sobre o tema, Lula citou o acordo de cooperação entre Brasil, Indonésia e Congo, que criou essa semana a chamada “Opep das Florestas” (“Aliança das Florestas”). Informando que não conhece muito os termos do acordo, Lula disse que a iniciativa “ será fortalecida pelo meu governo.

Conforme discursou, “Juntos, nossos três países detêm 52 por cento das florestas tropicais primárias remanescentes no planeta. Juntos, trabalharemos contra a destruição de nossas florestas, buscando mecanismos de financiamento sustentável, para deter o avanço do aquecimento global”, disse.  A “Opep das Florestas”, como foi apelidada a união entre os países, busca aprofundar a cooperação na agenda ambiental e a proteção de florestas tropicais. Na prática, a nova aliança deve trabalhar para que sejam efetivados mecanismos para o pagamento a países e Estados que possuem resultados de redução do desmatamento e proteção das florestas. O apelido faz menção à Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), que possui forte peso na economia mundial.

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Amazônia - Foto: Tarso Sarraf

Presidente-eleito defende preservação da Amazônia, mas com soberania e foco nas pessoas

Outro ponto bastante aplaudido durante o pronunciamento do presidente eleito foi a proposta de que seja realizada a primeira “Cúpula dos Países Membros do Tratado de Cooperação Amazônica”. Lula citou que o encontro entre Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela servirá para que possam “pela primeira vez, discutir de forma soberana a promoção do desenvolvimento integrado da região, com inclusão social e responsabilidade climática”.

Outra iniciativa já apresentada por Lula na COP 27 foi a candidatura do país a receber a COP 30, em 2025. “Seremos cada vez mais afirmativos diante do desafio de enfrentar a mudança do clima, alinhados com os compromissos acordados em Paris e orientados pela busca da descarbonização da economia global”. Em sua fala, Lula disse ainda que defende que o evento seja realizado numa cidade amazônica, como uma mensagem ao mundo para que “aqueles que não conhecem essa realidade, possam saber como vivem as pessoas nessa região”. Lula também adiantou que na reunião do G20 em que o Brasil irá presidir, em 2024, a agenda climática será uma das prioridades.

Ainda sobre a Amazônia, Lula voltou a destacar que irá combater as ilegalidades na região e que buscará cooperação internacional para subsidiar a fiscalização e o fomento ao desenvolvimento, mas sem interferência. “Estamos abertos à cooperação internacional para preservar nossos  biomas, seja em forma de investimento ou pesquisa científica. Mas sempre sob a liderança do Brasil, sem jamais renunciarmos à nossa soberania”, apontou.

O presidente eleito também frisou que terá foco na preservação, mas também com os habitantes da região. Lula citou a criação do Ministério dos Povos Originários, mas não adiantou o nome de quem deverá comandar a pasta, como chegou a ser especulado. “Os povos originários e aqueles que residem na região Amazônica devem ser os protagonistas da sua preservação. Os 28 milhões de brasileiros que moram na Amazônia têm que ser os primeiros parceiros, agentes e beneficiários de um modelo de desenvolvimento local sustentável, não de um modelo que ao destruir a floresta gera pouca e efêmera riqueza para poucos, e prejuízo ambiental para muitos”, afirmou.

Sobre o desmatamento, Lula afirmou que irá cumprir a meta de zero desmatamento até 2030. “Não há segurança climática para o mundo sem uma Amazônia protegida. Não mediremos esforços para zerar o desmatamento e a degradação de nossos biomas até 2030, da mesma forma que mais de 130 países se comprometeram ao assinar a Declaração de Líderes de Glasgow sobre Florestas.Por esse motivo, quero aproveitar esta Conferência para anunciar que o combate à mudança climática terá o mais alto perfil na estrutura do meu governo. Vamos priorizar a luta contra o desmatamento em todos os nossos biomas”, informou.

Outro ponto de destaque em sua fala foi a atenção dada ao agronegócio. “A produção agrícola sem equilíbrio ambiental deve ser considerada uma ação do passado. A meta que vamos perseguir é a da produção com equilíbrio, sequestrando carbono, protegendo a nossa imensa biodiversidade, buscando a regeneração do solo em todos os nossos biomas, e o aumento de renda para os agricultores e pecuaristas. Estou certo de que o agronegócio brasileiro será um aliado estratégico do nosso governo na busca por uma agricultura regenerativa e sustentável, com investimento em ciência, tecnologia e educação no campo, valorizando os conhecimentos dos povos originários e comunidades locais”, disse.

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Foto: Alice Martins

Lula quer mais países no Conselho de Segurança da ONU

Também durante sua fala, que teve como destino especialmente a comunidade internacional, Lula também sinalizou que irá, durante seu mandato, defender mais vagas e poder de veto no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).

O Conselho de Segurança é um dos principais órgãos das Nações Unidas. Formado por quinze países com direito a voto, apenas cinco tem cadeira permanente e poder de veto: Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, China e Rússia. Para o biênio 2022-2023, o Brasil conquistou um assento temporário para integrar o Conselho, repetindo feito que ocorreu apenas entre 2010 e 2011. “Voltamos para ajudar a construir uma ordem mundial pacífica, assentada no diálogo, no multilateralismo e na multipolaridade”, disse.

“Voltamos para propor uma nova governança global. O mundo de hoje não é o mesmo de 1945. É preciso incluir mais países no Conselho de Segurança da ONU e acabar com o privilégio do veto, hoje restrito a alguns poucos, para a efetiva promoção do equilíbrio e da paz”, afirmou Lula.